Mostrando postagens com marcador Literatura Indiana. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Literatura Indiana. Mostrar todas as postagens

30 de abril de 2020

O Mapa de um Desejo Impossível - Anuradha Roy

Literatura Indiana
Tradutora: Maria Fernanda Abreu
Editora: Nova Fronteira
Edição de: 2009
Páginas: 336

24ª leitura de 2020

Sinopse: Uma fotografia que se recusa a ficar parada. Retratada nela, uma casa que parece flutuar em um rio caudaloso de águas escuras... Com essa bela e instigante metáfora de sua própria narrativa, Anuradha Roy inicia o relato da história de três gerações de uma família bengalesa, de seus desejos e amores, seus dramas e correntezas mais profundas. Tudo começa na pequena cidade indiana de Songarh, onde Amulya e a esposa, Kananbala, constroem sua casa junto a um rio, com um belo jardim e um poço profundo, que nunca seca. Ali, a família vê crescer o número de vizinhos na rua pouco movimentada, envelhece, fala sobre amenidades durante o jantar... Certo dia, em 1927, Amulya salva Mukunda, uma criança nscida da relação entre o filho de um emprgado seu e uma moça de uma tribo, deixando-o num orfanato. Nesse meio-tempo, Nirmal, filho caçula de Amulya, casa-se com shanti, cuja casa paterna, em Manoharpur, também se situa às margens de um rio. É nessa casa que Shanti morre ao dar à luz Bakul. Quando a menininha está com quatro anos, Nirmal traz para a casa da família o garoto Mukunda, agora com seis anos. Apesar da oposição ferrenha de seu irmão e sua cunhada, uma vez que ninguém sabe a que casta o menino pertence, Mukunda passa a viver com eles, morando numa cabana no quintal e cuidando das tarefas domésticas. Bakul e Mukunda tornam-se amigos inseparáveis, mas, quando chegam à adolescência, essa amizade vai se transformando num sentimento mais profundo e as manobras familiares conseguem enfim afastar o rapaz da casa. Treze anos vão se passar até que Bakul e Mukunda voltem a se encontrar. E, a essa altura, a vida de todos mudou radicalmente. 



Um livro do qual eu pensei em me desfazer várias vezes. Eu o tinha adquirido através de uma troca em junho de 2013 e nunca sequer tinha ouvido falar da história. Creio que, na época, o que me chamou a atenção foi a capa melancólica, mas nem passou pela minha cabeça colocá-lo logo na lista de leituras. Simplesmente fui deixando o tempo passar... Cheguei a separar o livro algumas vezes, no intuito de trocá-lo ou doá-lo. Até o tirei da estante... Mas sempre sem entender o motivo, voltava atrás e decidia mantê-lo comigo. Talvez, bem lá no fundo, eu soubesse que não poderia abrir mão deste livro sem lê-lo. Talvez sentisse que ele se tornaria especial na minha vida. Que me marcaria

"Um dia ela desapareceria entre as árvores de verdade, e ninguém nunca mais a encontraria."

Não sei como falar de um livro tão complexo e intenso. Tão cheio de camadas, de dramas familiares, de escolhas equivocadas... Três gerações de uma mesma família. Mais de quarenta anos de uma história contada em 336 páginas. Ainda estou impressionada com o talento da autora em ter criado algo tão profundo, percorrendo tantos anos, em tão poucas páginas. Por incrível que pareça, elas foram suficientes...

Tudo começou em 1907. Amulya, sem se importar com a opinião de sua jovem esposa, resolveu se mudar de Calcutá para a pequena Songarh e ali estabelecer-se, construindo uma bela e sólida casa, que sobreviveria, quase sem deterioração, ao passar dos anos e guardaria em suas sombrias paredes os segredos daquela família. Aquele foi o começo do fim de Kananbala, a esposa de Amulya. O fim dos seus sonhos, das suas ilusões. Mas o início da história de seus dois únicos filhos: Kamal e Nirmal, que cresceriam juntos e cujos laços de sangue seriam colocados à prova pelos caminhos da vida. 

23 de dezembro de 2019

O que o Sol faz com as Flores - Rupi Kaur


Título Original: The sun and her flowers
Tradutora: Ana Guadalupe
Editora: Planeta
Edição de: 2018
Páginas: 256

Sinopse: o que o sol faz com as flores é uma coletânea de poemas arrebatadores sobre crescimento e cura. ancestralidade e honrar as raízes. expatriação e o amadurecimento até encontrar um lar dentro de você. 
organizado em cinco partes e ilustrado por rupi kaur, o livro percorre uma extraordinária jornada dividida em murchar, cair, enraizar, crescer, florescer. uma celebração do amor em todas as suas formas.


Desde que li Outros jeitos de usar a boca desejei mergulhar em outros textos da autora, tão tocantes, profundos, que atingem um ponto especial dentro de nós. E logo adquiri O que o sol faz com as flores

por que será 
que só quando uma história acaba
a gente começa a sentir cada página [Página 54]

Seguindo mais ou menos a mesma estrutura do livro anterior, O que o sol faz com as flores é dividido em cinco partes: murchar, cair, enraizar, crescer, florescer. Em cada uma delas encontramos poemas que "conversam" com a gente, que nos dão choques de realidade, tocam em feridas, mexem em temas que às vezes preferimos evitar, verdades que queremos ignorar. 

sim
é possível
odiar e amar alguém 
ao mesmo tempo
é o que faço comigo mesma
todo dia [Página 101]

Falando de diversos assuntos diferentes, e de certa forma interligados, a autora, com toda a delicadeza e simplicidade, típicas de seus textos (por mais diretos e crus que alguns sejam, há sempre aquela delicadeza marcante, que passa por toda sua escrita), trata de depressão, perda, términos, dependência emocional, amor-próprio, aceitação, imigração, família, feminismo, recomeços, filhos, natureza... são muitos os temas e até mesmo aqueles que menos esperamos mexem com algo em nós. 

a forma como você fala de si mesma
a forma como você se humilha
até ficar minúscula
é abuso [Página 103]

São poemas/textos que me tocaram muito, alguns me fizeram fechar o livro e ficar pensando por longos minutos em assuntos que eu própria tento não encarar para "fugir" de certas dores. Existem poemas dolorosos aqui, que nos machucam, mas o que predomina neste livro é o amor. A autora nos chama a nos aceitarmos, para aprendermos a nos amarmos como somos, nos libertando da prisão na qual a sociedade tenta nos fechar, que percebamos que juntas as mulheres podem muito mais do que poderiam fazer sozinhas, que não precisamos competir, que não temos que ser inimigas. 

o que pode ser mais forte
que o coração da gente
que se quebra em tantas partes
e ainda bate [Página 109]

São belíssimos os poemas dedicados à mãe, à família. Foram os que mais me emocionaram, que fizeram meus olhos se encherem de lágrimas. Os sacrifícios de uma mãe, de um pai, buscando dar um futuro aos filhos em terra estranha, num lugar desconhecido onde não tinham nada e precisavam recomeçar do zero. 

minha mãe sacrificou seus sonhos
para que eu sonhasse [Página 148]

Há um poema neste livro do qual transborda um amor lindíssimo, de uma filha por sua mãe. Ela se pergunta, ou melhor, pergunta aos céus, se seria possível, se ela implorasse, que quando sua mãe morresse sua alma pudesse regressar num bebê que ela gerasse. Que a alma de sua mãe retornasse num filho seu, para que ela pudesse recompensar tudo o que sua mãe fez por ela. Eu chorei com este poema. Me tocou especialmente.

É um livro que recomendo sem pensar duas vezes. Depois de uma leitura tão pesada como A Rosa Branca, eu precisava MUITO de um livro que me fizesse sentir mais leve, mais tranquila... em paz. 

23 de julho de 2018

Outros jeitos de usar a boca - Rupi Kaur

(Título Original: Milk and honey
Tradutora: Ana Guadalupe
Editora: Planeta
Edição de: 2017)

outros jeitos de usar a boca é um livro de poemas sobre a sobrevivência. sobre o amor, o sexo, o abuso, a perda, o trauma, a cura e a feminilidade.

o livro é dividido em quatro partes, e cada uma delas serve a um propósito diferente. lida com uma dor diferente. cura uma mágoa diferente.

outros jeitos de usar a boca transporta quem o lê em uma jornada por momentos amargos da vida e encontra uma forma de tirar delicadeza deles. 

publicado inicialmente de forma independente por rupi kaur, poeta e artista plástica nascida na índia e que vive no canadá, o livro se tornou o maior fenômeno do gênero nos últimos anos nos estados unidos, com mais de 1 milhão de exemplares impressos. 



Palavras de uma leitora...


- Hoje enquanto escrevo é sábado... Um dia que amanheceu lindo, mas que depois ficou deprimente quando escureceu mais cedo e uma ventania fez questão de encher tudo de poeira.rs Eu estava estressada por conta das leituras obrigatórias (para o TCC) e só queria ler algo que me fizesse bem. Que me acrescentasse algo. Não que enchesse meu cérebro com as informações essenciais para um bom trabalho e para a vida como profissional, mas algo que fizesse bem a mim, como pessoa, como mulher

O livro outros jeitos de usar a boca estava na minha lista de futuras leituras há algum tempo. Desde que ouvi falar maravilhas dele, do quanto era forte e incrível, do impacto que tinha provocado na vida de outros leitores. Mas com tantos livros para ler em 2018 e sem tempo algum para me dedicar a todos não fazia parte dos meus planos lê-lo ainda este ano. Além do mais, eu nem sequer tinha um exemplar dele. Ainda não tinha conseguido comprar, embora estivesse entre os que eram prioridade. Mas ontem, enquanto andava com a minha irmã, resolvi parar na livraria e comprá-lo. Trazê-lo para casa. Para o lugar que o esperava. Para minha vida. 

Foi inevitável começar a namorá-lo assim que o tive em minhas mãos. Ontem mesmo o folheei, cheirei, abracei, desejei mandar tudo para o inferno e mergulhar nas suas páginas. Queria sentir o que as outras pessoas tinham sentido. Queria que os poemas falassem comigo. Mas nada, absolutamente nada que eu pudesse imaginar, se compara à confusão de sentimentos que me invadiram quando li cada um dos poemas que compõem este livro. Foi uma experiência tão única, tão... Não tenho nem palavras. Só posso dizer que quero ler tudo o que essa poetisa escrever. Já sou sua fã incondicional. A Florbela Espanca sempre será a minha poetisa preferida, mas a Rupi Kaur conseguiu um lugar lado a lado com ela no meu coração. 

"é o seu sangue 
nas minhas veias
me diz como eu 
poderia esquecer" [Página 14]

- O livro é dividido em quatro partes: a dor, o amor, a ruptura, a cura. Cada uma delas agrupando poemas que não consigo definir de outra forma que não seja impactantes. A primeira parte, a dor, já começa nos dando um baita soco no estômago. São poemas que sangram, que te machucam pela quantidade de realidade que possuem. Falam de agressão, de estupro, de pedofilia, de violência doméstica, abandono... de puro sofrimento. Eu precisava respirar fundo depois de ler alguns deles. Sentia as lágrimas me cegando, conseguia visualizar aquelas cenas tão terríveis que os poemas desenhavam. Tantas vozes caladas, tantas pessoas sofrendo em seus próprios lares... em sua própria família. Eles me feriram muito. Mas não me arrependi nem por um segundo de lê-los. O talento dessa escritora é impressionante. A sua maneira crua e simples de falar... de mostrar situações que muitas vezes queremos ignorar. Em poucas linhas ela falava muito, tudo

"estremeço quando você me toca
temo que seja ele" [Página 41]

- A segunda parte, o amor, é como um alento. Conseguimos tomar fôlego, respirar normalmente, depois de todas as pancadas que levamos com a dor. São poemas lindos, que evocam lembranças de anos passados... de momentos preciosos. Que te recordam algo que você foi... que você teve. Que te fazem sorrir, sonhar, lembrar... desejar. Que fazem até mesmo você olhar para si mesma com outros olhos. Enxergar-se como a mulher que é, mas tenta esconder, uma vez que o mundo insiste em querer te diminuir e você faz a vontade dele. 

"Estou aprendendo 
a amá-lo
me amando" [Página 55]

- São poemas que falam, obviamente, de amor, mas não só do amor pelo outro, mas também do amor por si mesma. De encontrar-se para só então permitir que um outro alguém te possua. De entregar-se sabendo que continua no controle de si mesma, do seu corpo, da sua mente, do seu eu. Que falam sobre feminilidade, paixão, entrega, conquista, raiva, briga, reconciliação. 

- A terceira parte, a ruptura, não golpeia tão forte como a primeira, mas ainda assim nos atinge. São páginas que trazem lágrimas provocadas pela decepção, pela separação... por descobrir que o que dávamos como certo não era. Que o amor que acreditávamos existir nunca esteve ali. Às vezes saltamos com a fé em alguém, acreditando que essa pessoa irá nos segurar, que impedirá a queda, ou que, pelo menos, irá segurar forte a nossa mão quando estivermos no chão. Mas, não. Ela nem sequer estará mais presente. Já terá ido embora. 

"[...] quero gritar e berrar que somos nós seu idiota. somos as únicas
pessoas que podem nos unir novamente. mas em vez 
disso eu sento quieta. sorrindo de leve pensando
entre lábios trêmulos. é ou não é uma coisa trágica. 
quando você vê tudo tão claro mas a outra pessoa
não vê nada." [Página 84]

- A quarta e última parte, a cura, embora nos passe a ideia de poemas que vão reconstruir, cicatrizar feridas, também dói. Talvez porque o processo de cura nunca é fácil. É preciso fechar com pontos, se reerguer, dar um passo em frente mesmo achando que vai cair... É algo lento, mas progressivo. 

São páginas que te atingem no âmago, que te passam uma mensagem, que te dizem verdades. Não exatamente o que você quer ler, mas sim o que necessita. No fim fica um gosto agridoce. Você sorri em meio às lágrimas. Sente uma pressão no peito, mas também alívio e... paz. Se sente bem

"não procure cura
aos pés daqueles
que te machucaram" [Página 155]

- Devorei as páginas deste livro em pouco mais de uma hora. E isso porque precisava parar... porque ficava pensando, refletindo sobre o que tinha lido... viajando para dentro de mim mesma. Foi a escolha certa. Ler outros jeitos de usar a boca era tudo o que eu precisava para me enxergar outra vez como pessoa. Ultimamente tenho me visto mais como uma máquina que não pode parar, que precisa estar sempre trabalhando, estudando, sendo eficiente. Mas eu sou gente. Preciso parar e respirar. Sou mulher... e preciso me sentir como tal.  Me importar mais comigo mesma. Me amar antes de amar o outro. Me aceitar antes de querer que o outro aceite. Me olhar no espelho e enxergar mais do que a imagem refletida nele.

Se recomendo este livro?! De olhos fechados! É uma leitura que... nem sei como dizer. O que nos provoca é difícil de expressar. Mas é algo que nos faz bem. E isso basta. 
Topo