Este mês não li muitos contos. Foram apenas cinco: dois do Machado de Assis, um do Monteiro Lobato e dois da Clarice Lispector. Foi um mês longo, mas apesar disso muito corrido, o que dificultou manter em dia algumas leituras.
Em Miss Dollar, do Machado de Assis, conhecemos a cadelinha cujo nome dá título ao conto. Apesar de sua participação ser importante, ela não é a real protagonista, mas sim o Dr. Mendonça, um homem apaixonado por cachorros e que dá abrigo para a pequena Miss Dollar, até que descobre quem são seus verdadeiros donos. Então, se colocando no lugar daquelas pessoas que estavam infelizes sem a cadelinha amada, ele vai até a residência delas e lhes entrega a pequena. Acontece que isso o faz conhecer Margarida, uma jovem viúva pela qual ele se apaixona perdidamente. Aqui temos Machado de Assis no seu melhor (e raro) estilo romântico.rs
Marcha Fúnebre traz a história de um homem que recebe a notícia da morte de seu inimigo. Embora não gostasse do falecido, ele não deixa de sentir certa compaixão e fica pensando no fato do outro ter sofrido muito antes de morrer, vez que vinha definhando há tempos. Ele então fica com isso na cabeça, pensando que desejaria para si mesmo uma morte súbita, algo que mal sentisse. E o conto vai se desenvolver em torno das reflexões dele.
Já do Monteiro Lobato li o conto A facada imortal que demorei bastante para entender e necessitei de uma segunda leitura para finalmente "decifrar" o texto. Isso porque não sabia o que era "fazer sangrar", "facada" e coisas assim, no contexto da história. Só depois de ler pela segunda vez é que compreendi que o personagem principal do conto, Indalício, era um jovem que tinha como "dom" utilizar sua lábia para arrancar dinheiro dos outros. Mas ele não o fazia como alguém que pede esmola. Não. Ele o fazia de modo astuto e elegante, fazia a pessoa lhe "emprestar" o dinheiro (sem que ele tivesse a intenção de devolver) atingindo de alguma forma o ponto fraco daquela pessoa, fosse bajulando, apelando para a vaidade do outro... Só que existia um amigo, Raul, que era um pão-duro, alguém que não emprestava nada para ninguém e a quem todos sabiam que Indalício nunca conseguiria enganar. Então, Indalício resolve que esse será seu desafio, fazer Raul ceder.
Come, meu filho é um conto curtinho, de menos de duas páginas, que eu achei divertido. Nele temos um menino que para ludibriar a mãe que quer que ele coma (mas ele não quer comer), começa a falar sem parar sobre diversos assuntos. Como o fato de ensinarem que a Terra é redonda, sobre pepino parecer irreal e algumas coisas não terem gosto daquilo que são chamadas, e para ele definitivamente carne não tem gosto de carne.rs
Perdoando Deus é um conto mais complexo, que nos faz refletir bastante sobre o que conhecemos de nós mesmos. A protagonista está caminhando num dia bonito, em que se sente em paz consigo mesma, se sente livre, percebendo o mundo, o mar, os edifícios, tudo ao seu redor. E ela se sente tão em paz e conectada com a natureza e com o próprio Deus, que sente que pode amar tudo, de forma natural, um carinho tão puro quanto o de uma mãe. E ela vai pensando nisso até quase pisar num rato morto. E é quando se revolta. Porque de tudo que poderia cruzar seu caminho foi justamente um rato, um animal que lhe provocava pânico desde que se entendia por gente. E ali estava a prova de que não era possível amar "tudo e todas as coisas".
"E a revolta de súbito me tomou: então não podia eu me entregar desprevenida ao amor? De que estava Deus querendo me lembrar?"
Depois que a raiva passa o episódio lhe provoca novas reflexões e é aí que o conto se torna mais profundo. Eu amo a forma como a Clarice Lispector nos faz olhar para dentro de nós, pensar em coisas sobre as quais não refletiríamos normalmente. Por que amamos Deus? Por que amamos alguém? O que algo ou alguém precisa ter para despertar nosso amor?
"É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria - e não o que é."
Apesar de ter lido poucos contos este mês, os que li valeram a pena. :)